"A essência, a dificuldade, a nobreza da advocacia é esta: sentar-se sobre o último degrau da escada ao lado do acusado. As pessoas não compreendem aquilo que de resto nem os juristas entendem; e riem, zombam, escarnecem. Não é um mister que goza da simpatia do público, ainda do Cirineu. As razões, pelas quais a advocacia é objeto, no campo literário e também no campo litúrgico, de uma difundida antipatia, não são outras senão estas. (...) Deixemos claro: a experiência do advogado está sob o signo da humilhação. Ele veste, porém, a toga; ele colabora, entretanto, para a administração da justiça; mas o seu lugar é embaixo; não no alto. Ele divide com o acusado, a necessidade de pedir e de ser julgado. Ele está sujeito ao juiz, como está sujeito o acusado. Mas justamente por isso a advocacia é um exercício espiritualmente salutar. Pesa a obrigação de pedir, mas recompensa-se. Habitua-se a suplicar. O que é mais senão um pedir a súplica? A soberba é o verdadeiro obstáculo à suplicação, e a soberba é uma ilusão de poder. Não há nada melhor que a advocacia para sanar tal ilusão de potência. O maior dos advogados sabe não poder nada frente ao menor dos juízes; entretanto, o menor dos juízes é aquele que o humilha mais. É obrigado a bater à porta como um pobre. E não está nem escrito sobre a porta "pulsate et aperietur vobis"*. Não raramente se bate em vão. A experiência se faz mais dolorosa e mais salutar. Pensava-se que tivesse razão. Tanto estudo, tanto suor, em vez... Para entender, é preciso conhecer estes momentos."
Francesco Carnelutti, As Misérias do Processo Penal
* "Batei e abrir-se-vos-á"
Há dois anos, por conta de uma matéria odiosa chamada Estudos dos Clássicos, foi-me apresentado esse livro e eu tive que ler, a princípio por obrigação. Mas ele foi, de longe, o que mais se fez proveitoso ao longo dessa faculdade. Ele foi responsável por uma mudança de pensamentos e quebra de pré-conceitos em relação ao próprio ofício do advogado. Não que hoje eu tenha uma ideia linda do que seja advogar; é só reler a parte do "...está sob o signo da humilhação" para ter certeza que é uma profissão pesada, e não-fácil. Aliás, o fácil passa longe. Recomendo.
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